Da Terra Rural à Freguesia
Urbana: Notas Históricas sobre a Evolução de Paranhos
Através da análise de fontes
paroquiais, registos toponímicos e documentação histórica, propõe-se
reconstituir a transformação deste território desde a sua ocupação medieval até
à sua plena integração na malha urbana portuense. Através de um olhar
patrimonial, procura-se evidenciar os traços de continuidade entre o passado
rural e o presente urbano, sublinhando o papel da toponímia, das práticas
comunitárias e do património edificado na preservação da memória local.
1. Introdução
A freguesia de Paranhos representa um caso paradigmático de transição entre a ruralidade histórica e a urbanidade contemporânea. Localizada na parte oriental do concelho do Porto, a sua evolução territorial e populacional espelha os processos de expansão urbana, mas também a permanência de elementos patrimoniais que resistem à homogeneização do espaço urbano. Este estudo propõe uma abordagem cronológica e temática da freguesia, valorizando fontes históricas como as Memórias Paroquiais (1758), registos do Cabido da Sé do Porto e tradições toponímicas transmitidas oralmente.
2. Origem Medieval e Formação
do Couto Eclesiástico
A ocupação humana de Paranhos
remonta ao período anterior à fundação do Condado Portucalense. À época, a
região era habitada por populações muçulmanas e conhecida pelo topónimo Paramio.
A cristianização da área levou à edificação, no século X, de uma igreja por
parte de lavradores abastados, em torno da qual se estruturou o povoado. D.
Teresa, mãe de D. Afonso Henriques, instituiu o Couto de Paranhos em favor da
Igreja Portucalense, reforçando a sua ligação ao poder eclesiástico (Cunha,
1623/1989).
O nome "Paranhos"
tem sido objecto de diferentes interpretações etimológicas. Segundo Cunha e
Freitas (citado em Silva, 2002), derivaria de Paranho,
significando "defendido por honra". Uma versão lendária sugere que a
designação advém da expressão popular "para-anhões", referindo-se a
abrigos de madeira usados por pastores para proteger cordeiros (anhões).
3. Estrutura Rural e
Crescimento Populacional (séculos XII–XIX)
Paranhos surge documentada
como "Vila" em 1130, embora já se encontre mencionada em registos de
1035 e 1048. Entre 1519 e 1837 integrou a "Terra da Maia",
tornando-se parte do concelho do Porto em 1837, após obter a sua Junta de Paróquia
em 1835 (Almeida, 1999).
Durante grande parte da sua
história, a freguesia manteve um perfil rural, composto por casais e quintas
agrícolas, abastecidos por regatos e nascentes. A principal fonte de água era a
Arca d’Água, cuja importância se estendeu à cidade do Porto a partir do século
XVI. A primeira canalização data de 1886, marcando o início do desaparecimento
dos fontanários.
A estrutura fundiária era
dominada pela Igreja, detentora de várias quintas, como a do Regado, Tronco e
Paço. O sistema de emprazamento permitiu a continuidade da propriedade por
famílias influentes, como os Carneiro, até ao século XIX.
A evolução demográfica de Paranhos reflecte um crescimento gradual: de 246 habitantes em 1623 para 1.541 em 1801. No final do século XIX, a população ultrapassava os 5.000 habitantes, dedicando-se maioritariamente à agricultura (Carneiro da Silva, 1758).
4. Toponímia e Património
como Marcas de Memória
A toponímia de Paranhos
constitui um importante indicador da sua história agrária. Diversas aldeias,
quintas e campos legaram os seus nomes às artérias urbanas actuais, como a Rua
do Amial, Aval de Cima, Covelo, Barrocas ou Antas. As Memórias Paroquiais
de 1758 registam quinze aldeias, às quais se somam outras posteriores, como
Aguardente, Novo do Monte e Agrinhas.
Algumas denominações foram
substituídas, como o Largo da Aguardente, rebaptizado Praça do Marquês de
Pombal em 1882. A toponímia, no entanto, continua a constituir uma forma eficaz
de preservação da memória local.
5. Urbanização e
Transformação Social no Século XX
A urbanização de Paranhos
intensificou-se a partir do século XX. O processo de substituição de quintas
por edifícios, iniciado em 1959, alterou profundamente a fisionomia do
território. Com a construção da Via de Cintura Interna e a pavimentação das
antigas vias agrícolas, Paranhos consolidou-se como uma das freguesias mais
urbanizadas do Porto.
Com uma área de 6,67 km², é
hoje a segunda maior freguesia do concelho e a mais populosa, com 44.298
habitantes fixos e cerca de 5.500 residentes flutuantes, em grande parte
estudantes do ensino superior (INE, 2021). A identidade rural sobrevive, porém,
em práticas sociais como o atendimento personalizado do comércio local, as
procissões religiosas e o legado edificado.
A Casa-Museu Fernando de
Castro, doada à cidade por um abastado comerciante e bibliófilo local,
constitui exemplo notável de património edificado que expressa o gosto
artístico e o espírito de partilha de elites locais.
6. Conclusão
A história de Paranhos revela
uma complexa articulação entre tradição e modernidade. De aldeia agrícola a
freguesia urbana, o território preserva marcas materiais e simbólicas de um
passado que se resiste a desaparecer. A valorização do património toponímico,
documental e edificado é essencial para compreender a identidade de Paranhos e
integrá-la num processo de desenvolvimento sustentável e consciente da sua
história.
Bibliografia
- Almeida, J. A. (1999). História
do Porto. Porto: Edições Afrontamento.
- Carneiro da Silva, J. (1758). Memórias
Paroquiais da Freguesia de Paranhos. Torre do Tombo.
- Cunha, R. da. (1623/1989). Catálogo
dos Bispos do Porto. Edição fac-similada. Porto: Arquivo
Distrital do Porto.
- Instituto Nacional de
Estatística. (2021). Censos 2021 - Resultados definitivos.
Lisboa: INE.
- Silva, M. A. (2002). Toponímia
e Identidade: Paranhos e o Porto Rural. Revista de História
Local, 7(2), 33–56.
PARA CONSULTA ESTÁ DISPONÍVEL O LIVRO:
S. Veríssimo de Paranhos de Horácio Marçal
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"No sítio da Mãe-de-Água...", agora Jardim de Arca d'Água,
um Duelo entre Ramalho e Antero.
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9 de Abril de 1918
AV. DOS COMBATENTES DA GRANDE GUERRA | PRAÇA 9 DE ABRIL (Jardim de Arca d'Água)
Dados históricos da freguesia por datas
1587 – Realiza-se o primeiro baptismo com assento a 29 de Novembro, com o nome de André
1588 – A 25 de Junho realiza-se o primeiro assento de casamento entre Thomas Annes e Catarina Annes
1588 – A 20 de Novembro realiza-se o primeiro assento de óbito com o funeral de João da aldeia de Lamas
.
1689 – A localidade de Paramio passa a chamar-se, oficialmente, e pela primeira, vez Paranhos
1835 – É criada uma Junta da Paróquia, que a partir de 1910 se chamou Junta de Freguesia
1837 – Por carta de Lei de 27 de Set. 1837 Art 1º esta freguesia foi "retirada do concelho da Maia e anexada ao do Porto por lhe estar mais próxima para todos os misteres da vida civil e religiosa.A freguesia de Paranhos é integrada na cidade do Porto".
1873 – É estabelecido o primeiro serviço público de transportes da Carris para Paranhos, feito por tracção animal com os “carros americanos” puxados por uma ou duas parelhas de mulas.
1883 - O benemérito Conde de Ferreira (Joaquim Ferreira dos Santos) deixa no seu testamento a edificação de um hospital, no antigo Largo das Regateiras, para “alienados” na freguesia
1891 – Chega pela primeira vez a iluminação pública à freguesia, a gás
1895 - Os carros de tracção animal começam a ser substituídos por veículos de tracção eléctrica
1900 – Há 13 848 residentes na freguesia
1905 - Ano em que se registou o maior número de óbitos: 420
1922 – Chega a iluminação eléctrica à freguesia
1926 – Ano em que se registou o maior número de baptismos: 678
1947 – Ano com o maior número de casamentos: 194 uniões
1948 – Os Serviços de Transportes Colectivos do Porto realizam o seu primeiro serviço na freguesia
2001 – População residente: 48 686 habitantes, dos 22 010 são homens e 26 676 são mulheres.
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